"Alguns rumores de que Carlos Queiroz e os seus novos conselheiros de imagem procurariam a todo o transe recuperar o prestígio esbanjado nos últimos dois anos foram ontem desmentidos, na forma e no conteúdo, pela convocatória para o Mundial da África do Sul em que conseguiu agravar o cisma, não só dos adeptos do Benfica, mas juntando-lhes agora também os do Sporting. Ao som de trombetas zulus e com a identidade cultural dos "guys" dessa banda de referência lusitana chamada Black Eyed Peas, Queiroz chamou uma voz da América para anunciar a seleção dele aos outros portugueses.
Após uma campanha de qualificação medíocre e terminada a ferros, vogando numa inexplicável ascensão ao terceiro lugar do ranking mundial, Queiroz teve cinco meses para elaborar um plano e definir uma seleção unificadora, sem esquecer um plano de comunicação que atenuasse a desconfiança e despertasse o necessário apoio de mais portugueses. A ideia parece inspirada, de forma canhestra, no plano original de Scolari de começar por hostilizar o clube dominante, através de Vítor Baía, para despertar na maioria dos portugueses um suporte fervoroso à equipa nacional - o mais incondicional e alargado que algum dia ela teve.
Como qualquer um, depois de surpreendido com uma lista de 50 pré-convocados, numa manobra digna de uma Federação terceiro-mundista, tentei colocar-me na cabeça do selecionador, mas logo percebi que seria impossível descobrir os seus jokers e entender a sua bizarra tendência para o absurdo.
Por isso, ainda alarguei o exercício com uma margem de segurança e, em vez de 23, escolhi 29, admitindo uma "tolice" por cada sector e especialidade, na esperança de uma identidade que me auxiliasse na compreensão da constituição da equipa, ao longo do mês que falta para o início do Mundial.
Mesmo assim, falhei por três, o que me inflige uma deceção arrasadora. Como é que eu, português, vou justificar as chamadas de Daniel Fernandes, Ricardo Costa ou José Castro? Que qualidade individual ou prestação técnica e tática pode oferecer à Seleção Nacional cada um destes jogadores? Que critério conduziu à escolha deste insólito trio, refletindo-se na exclusão de Quim, Ruben Amorim, Daniel Carriço, Carlos Martins, Nuno Assis ou Makukula?
E quem vai entender a ideia de abrir uma nova frente de combate com a exclusão de João Moutinho, completamente desajustada dos dois anos de trabalho que ficam para trás: o capitão do Sporting era um dos cinco jogadores que não tinham falhado qualquer das 12 convocatórias anteriores de Carlos Queiroz.
Com a opção deliberada por estrangeirados sem referência entre nós, o selecionador deu sinal de não pretender, afinal, qualquer "reconciliação" nacional e aproveitou a proximidade quotidiana dos jogadores do Benfica e do Sporting para condená-los em função do cariz internacionalista que visa adequar a imagem de Portugal à das seleções de África e da América do Sul. Só lhe falta agora transferir os jogos caseiros para Londres, Paris ou Zurique."
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