Uma das primeiras coisas que se aprende no Direito, mas os leigos também têm essa percepção, é de que as leis são gerais e abstractas, isto é, dirigem-se a uma generalidade de pessoas e são aplicáveis a um número indeterminado de casos. Quando este princípio não é respeitado na elaboração de um regulamento que, pela sua natureza, deve ser geral e abstracto, normalmente produz maus resultados.
Vem isto a propósito da suspensão preventiva por tempo indeterminado aplicada aos jogadores do FC Porto, arguidos no famoso (e tristemente famoso) processo do túnel. Segundo consta, esta norma teria surgido por proposta daquele clube, o que causou perplexidade. E mais perplexidade causou o facto de, no recurso para o CJ da FPF, se ter alegado inconstitucionalidade, "por violação do direito ao trabalho como direito de natureza análoga a um direito fundamental, previsto nos arts. 47º e 58º da CRP".
Porém, não me causa perplexidade a eventual inconstitucionalidade de tal norma, pois amiúde se constata a inconstitucionalidade de normas aprovadas pela Assembleia da República, por vezes de forma evidente. Veja-se o caso do Estatuto dos Açores. São casos de obsessão política com determinados objectivos que fazem esquecer o direito. Há leis que se não podem, nem devem, "negociar".
O que me interrogo, no caso referido, é o que se pretendeu atingir em concreto com aquela proposta, e quais os bastidores feitos para que ela fosse aprovada em assembleia. Então os clubes não viram, ou não sabem, que ela um dia lhes poderia ser aplicada?
A essa não assisti, mas, há mais de dez anos, quando andava pelas assembleias da Liga, o major Valentim Loureiro apresentou uma proposta da União de Leiria que, perante uma possível descida de divisão, e, na tentativa de a evitar, pretendia alargar o número de inscrições de jogadores, para poder contratar mais. Isto, numa altura da época em que as normas só podiam ser alteradas para vigorar na época seguinte, a menos que houvesse unanimidade dos clubes.
Sabia que tinha havido conversas com os diversos clubes e tudo parecia encaminhado para a aprovação. Mas como eu não tinha feito parte dessas negociações, interrogava-me intrigado o que poderia levar um clube que, eventualmente, descesse em vez da União de Leiria, a não se opor, desde logo, à discussão. Pedi a palavra, em nome do Sporting, e desde logo declarei que o Sporting votaria contra, inviabilizando a unanimidade e a a necessidade de discussão.
Julgo que este caso concreto é elucidativo da forma e do modo como se elaboram, por vezes, os regulamentos - com um objectivo concreto, embora camuflado. Acontece que, quando se negoceia uma lei, sem objectivos de generalidade e abstracção, "o feitiço vira-se contra o feiticeiro"!
Pensarão os meus caros leitores, que a minha conclusão é - bem feito ! Mas, enganam-se! É, simplesmente, ... triste!...
(DIAS FERREIRA, Record)
Vem isto a propósito da suspensão preventiva por tempo indeterminado aplicada aos jogadores do FC Porto, arguidos no famoso (e tristemente famoso) processo do túnel. Segundo consta, esta norma teria surgido por proposta daquele clube, o que causou perplexidade. E mais perplexidade causou o facto de, no recurso para o CJ da FPF, se ter alegado inconstitucionalidade, "por violação do direito ao trabalho como direito de natureza análoga a um direito fundamental, previsto nos arts. 47º e 58º da CRP".
Porém, não me causa perplexidade a eventual inconstitucionalidade de tal norma, pois amiúde se constata a inconstitucionalidade de normas aprovadas pela Assembleia da República, por vezes de forma evidente. Veja-se o caso do Estatuto dos Açores. São casos de obsessão política com determinados objectivos que fazem esquecer o direito. Há leis que se não podem, nem devem, "negociar".
O que me interrogo, no caso referido, é o que se pretendeu atingir em concreto com aquela proposta, e quais os bastidores feitos para que ela fosse aprovada em assembleia. Então os clubes não viram, ou não sabem, que ela um dia lhes poderia ser aplicada?
A essa não assisti, mas, há mais de dez anos, quando andava pelas assembleias da Liga, o major Valentim Loureiro apresentou uma proposta da União de Leiria que, perante uma possível descida de divisão, e, na tentativa de a evitar, pretendia alargar o número de inscrições de jogadores, para poder contratar mais. Isto, numa altura da época em que as normas só podiam ser alteradas para vigorar na época seguinte, a menos que houvesse unanimidade dos clubes.
Sabia que tinha havido conversas com os diversos clubes e tudo parecia encaminhado para a aprovação. Mas como eu não tinha feito parte dessas negociações, interrogava-me intrigado o que poderia levar um clube que, eventualmente, descesse em vez da União de Leiria, a não se opor, desde logo, à discussão. Pedi a palavra, em nome do Sporting, e desde logo declarei que o Sporting votaria contra, inviabilizando a unanimidade e a a necessidade de discussão.
Julgo que este caso concreto é elucidativo da forma e do modo como se elaboram, por vezes, os regulamentos - com um objectivo concreto, embora camuflado. Acontece que, quando se negoceia uma lei, sem objectivos de generalidade e abstracção, "o feitiço vira-se contra o feiticeiro"!
Pensarão os meus caros leitores, que a minha conclusão é - bem feito ! Mas, enganam-se! É, simplesmente, ... triste!...
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